Imagens de Brian Rea, ilustrações para a coluna Modern Love do New York Times |
O amor e a cidade são duas coisas
difíceis de se entrosar. Mais a cidade é grande, mais é difícil o amor.
Tamanhos diretamente proporcionais. As possibilidades se multiplicam devido às
situações que a metrópole propicia, ainda mais numa metrópole tropical com
vivência de rua. Ainda mais numa metrópole tropical com uma vivência de Rua profundamente
enraizada numa cultura do Carnaval.
As geometrias urbanas unem e dividem. Me lembro nitidamente da fala de uma amiga italiana na Argentina. ‘Aqui é suficiente – dizia ela – uma pessoa morar em Belgrano e a outra em La Boca (dois bairros relativamente longe da cidade de Buenos Aires) para o amor não dar certo.’ Eu sempre fico pensando que antes as pessoas não tinham metrô, não tinham celulares e ainda assim dava mais certo do que hoje. O espaço físico urbano se dilata nas redes, transborda em milhares de linhas de conexões que partem de celulares, tablets e computadores; Facebook, Instagram e aplicativos de paquera explícita, como o Tinder e o Happen, ampliam esse espaço urbano. Na verdade você se afoga em contatos que não sabe gerir, e que acabam sendo todos superficiais. Mais tem, mais troca. Mais troca, mais não se aprofunda. Mais não se aprofunda, mais troca de novo. Tendencialmente eu sou bastante livre para acreditar que a fluidez dos relacionamentos não precisa passar por etiquetas, e entendo — apesar de não ter um namoro faz dez anos — a ideia de que relacionamentos livres talvez possam ser mais saudáveis do que relacionamentos monogâmicos marcados por infidelidades reiteradas, a maioria unicórnio, porque é quase sempre o macho alfa que trai. Mas ultimamente começo a pensar que o “troca-troca”, como já algumas feministas também começam a insinuar, talvez seja só uma forma acumulativa capitalista de viver o amor. Não sei mais se por trás dessa liberdade não se esconde uma outra forma de capitalismo, o consumo do outro, a descartabilidade das relações e uma competição desigual entre as pessoas que precisariam de mais tempo para se fazer conhecer. Como se a Kombucha produzida artesanalmente quisesse competir com a Coca-Cola. Confesso não ter uma ideia definida, mas é um pensamento que começa a se insinuar na minha mente também.
As geometrias urbanas unem e dividem. Me lembro nitidamente da fala de uma amiga italiana na Argentina. ‘Aqui é suficiente – dizia ela – uma pessoa morar em Belgrano e a outra em La Boca (dois bairros relativamente longe da cidade de Buenos Aires) para o amor não dar certo.’ Eu sempre fico pensando que antes as pessoas não tinham metrô, não tinham celulares e ainda assim dava mais certo do que hoje. O espaço físico urbano se dilata nas redes, transborda em milhares de linhas de conexões que partem de celulares, tablets e computadores; Facebook, Instagram e aplicativos de paquera explícita, como o Tinder e o Happen, ampliam esse espaço urbano. Na verdade você se afoga em contatos que não sabe gerir, e que acabam sendo todos superficiais. Mais tem, mais troca. Mais troca, mais não se aprofunda. Mais não se aprofunda, mais troca de novo. Tendencialmente eu sou bastante livre para acreditar que a fluidez dos relacionamentos não precisa passar por etiquetas, e entendo — apesar de não ter um namoro faz dez anos — a ideia de que relacionamentos livres talvez possam ser mais saudáveis do que relacionamentos monogâmicos marcados por infidelidades reiteradas, a maioria unicórnio, porque é quase sempre o macho alfa que trai. Mas ultimamente começo a pensar que o “troca-troca”, como já algumas feministas também começam a insinuar, talvez seja só uma forma acumulativa capitalista de viver o amor. Não sei mais se por trás dessa liberdade não se esconde uma outra forma de capitalismo, o consumo do outro, a descartabilidade das relações e uma competição desigual entre as pessoas que precisariam de mais tempo para se fazer conhecer. Como se a Kombucha produzida artesanalmente quisesse competir com a Coca-Cola. Confesso não ter uma ideia definida, mas é um pensamento que começa a se insinuar na minha mente também.
Não são poucas as dificuldades,
aliás, que se vivem também por causa de questões mal resolvidas da
masculinidade contemporânea. A maioria dos machos descontruídos se revelam
esquerdo-machos, gostam de ser livres, mas quando a mulher também o é, incomoda.
Já me aconteceram casos de pessoas colocarem de forma inadequada (no tempo e no
modo inapropriado) um “Eu não sou monogâmico”, e frente a uma resposta “Eu
também não”, vejo a cara deles mudar de cor. Agora não é que naquele momento eu
estivesse necessariamente envolvida com outras pessoas, mas simplesmente quis
marcar uma igualdade de plano, uma reciprocidade afetiva. Marcar o fato de que
se eu quisesse também poderia, mostrando o desnecessário que era aquela
declaração naquele momento. Me desculpem, mas não vou ser a mulher do “Samba da
Benção” do Vinicius, que espera o homem triste e chorando com as mãos cheias de
perdão. Não mesmo.
Esses mesmos machos esperam às duas da manhã para te chamar e se você estiver em outra ficam loucos. Agora liberdade é para quem e para quê? Só para os machos e como exercício de poder? Não seria mais fácil, às vezes, assumir que está a fim de uma pessoa correndo o risco de “perder” as outras 100 que ficarem no seu caminho? Ou é só uma questão de domínio e controle do outro? No fundo, se você ligar para uma mulher às duas da madrugada e achar que ela está te esperando, não é uma forma de colonização do outro? Exercício de domínio emocional baseado na prática da falta e da chantagem implícita, do tipo ou vai estar disponível agora ou logo depois vai ter outra ocupando o seu lugar e quem sabe quando vai chegar de novo (se chegar) a sua vez.
Aí depois, além da afirmação
dessa liberdade com regras aleatórias para cada um garantir para si as mil
oportunidades (inutilizadas) que poderiam passar pelo seu caminho, a complicar
as relações hétero, chega a diferença na organização do percurso de vida entre
homens e mulheres. Já tem muitos anos que moro sozinha e pago as minhas contas,
e isso apesar de poder parecer algo que as amigas dizem para te consolar quando
alguém de quem você gostava vai embora, estressa demais os homens da sua faixa
etária que ainda não tomaram caminhos profissionais e moram em situações de
dependência financeira ou fortes limitações. Sem emitir nenhum julgamento de
valor sobre as escolhas e percursos individuais, pois cada um tem o seu
percurso de vida, é um dado concreto que as mulheres têm uma preocupação maior
com a realização profissional e autonomia financeira. Agora essa seria uma
culpa a mais para um relacionamento não dar certo? O homem ou se sente inferior
ou acha que você teve sorte (vai conseguir explicar para a criatura que meu pai
era operário e minha mãe costureira), ou
em muitos casos encosta na mulher.
Quem sabe mais para frente as
mulheres hétero tenham menos problemas nos relacionamentos com os homens,
porque talvez esses já tenham superado todas as crises do século XXI com as
quais nos deparamos nós que temos 30 e pouco agora.
Aí entre encontros fortuitos na
rua, aplicativos e cansaço, chega uma hora em que você não olha mais para a
idade. Entre quarentões e novinhos alguma coisa muda, mas não a substância. Os
quarentões (incluindo também os da minha idade, dos 33 para cima) medem
qualquer movimento, palavra, olhar, mensagem, com conta-gotas, pois eles têm um
medo terrível de você se apaixonar por eles, como se você estivesse apenas esperando
por eles para entrar num relacionamento (quanta convicção!). Os novinhos, por
outro lado, não têm esse medo – você, mulher mais velha e experiente, para eles
funciona um pouco como uma musa – portanto se expõem sem nenhum problema, já
que eles nem preveem a possibilidade de você se apaixonar por eles, e com razão
diria eu, apesar de serem um ótimo remédio para a autoestima. Mas já vi pessoas
adultas terminarem comigo para namorarem sério com garotas de vinte anos, isso,
nas minhas cogitações, porque com uma pessoa de 30 teriam a obrigação de se
comportarem de forma mais estruturada, mais adulta, deveriam sofrer a
comparação sobre a questão financeira, enquanto com pessoas mais jovens ainda
exercitariam o direito a se comportarem como adolescentes, e apesar da
diferença de idade, talvez teriam mais proximidades de estilos de vida. Para dar um exemplo banal, eu não
posso acordar tarde todos os dias.
Alguns indivíduos (transversais às idades) surgem de vez em quando, e logo no primeiro encontro, fazem questão de
mostrar que eles não são como todos os
outros cariocas. São mais gentis, mais diferentes, mais sensíveis, mas de
forma tão excessiva que você começa a desconfiar. De fato, ou vão sumir logo
depois ou têm algum segredo que você vai descobrir com o tempo. Esses mesmos te
acusarão de ser fria e distante, sem entender que uma pessoa acostumada ao caos
da Babilônia e a se defender não costuma ser tão acessível de primeira. Esses
que fazem questão de parecer diferentes e exagerar em declarações eu chamo de
excessivos, sim eles são excessivos e não temperamentais. Pois, o temperamental
excede porque sente, os excessivos excedem porque exageram coisas que não
sentem, falam da boca para fora.
Mais o tempo passa mais levamos
feridas, histórias, atitudes fossilizadas, onde o inconsciente e as lembranças de
decepções e expectativas desatendidas falam mais alto e guiam nossos
comportamentos, formas de falar, e nem percebemos mais. Isso tudo pode
incomodar, mas é o nosso histórico, as pessoas podem ler como uma falta de
leveza, mas as histórias de vida constituem nossa topografia sentimental e
guiam nossas ações. Pois, não é verdade que, quando o cachorro sabe que apanha
se fizer algo errado não faz mais? Como diz um aluno meu: ‘Se tem quem bate, é
porque sempre tem quem apanha’. Sinceramente, se a experiência nos
relacionamentos serve para alguma coisa, é para o desenvolvimento da
inteligência emocional. Ninguém quer apanhar, mesmo se isso significa colocar
algumas barreiras defensivas necessárias. Pois a gente aprende a não se expor.
Concluindo. Outro dia me autofiz
uma sessão de tarô (psicanalítica) sobre o amor, tentando desvendar algumas
dúvidas para refletir sobre casos e joguei três cartas: passado, presente e
futuro. O passado tem a Torre (16), o presente a Sacerdotisa (3) e o futuro a Morte
(13). Essas cartas fazem todo o sentido para mim.
A torre que cai é a ilusão desatendida, o vislumbre da ilusão de que você vai desafiar o céu. Mas a torre cai, e cai também a presunção de pensar que algumas coisas eram de um jeito que não eram. A queda é a punição por ter tido essa vaidade e excesso de gênio. No fundo, a torre cai porque foi desafiado Deus. Quando nova, sempre me equivocava, achava que alfa fosse beta e para que alfa fosse beta forçava a leitura das coisas em algum sentido, fazia tudo do jeito que sentia, seguia só o fluxo potente dos sentimentos e obviamente a torre caía. A torre que cai é a instabilidade, a precariedade emocional, o desmoronar das convicções e das construções.
A torre que cai é a ilusão desatendida, o vislumbre da ilusão de que você vai desafiar o céu. Mas a torre cai, e cai também a presunção de pensar que algumas coisas eram de um jeito que não eram. A queda é a punição por ter tido essa vaidade e excesso de gênio. No fundo, a torre cai porque foi desafiado Deus. Quando nova, sempre me equivocava, achava que alfa fosse beta e para que alfa fosse beta forçava a leitura das coisas em algum sentido, fazia tudo do jeito que sentia, seguia só o fluxo potente dos sentimentos e obviamente a torre caía. A torre que cai é a instabilidade, a precariedade emocional, o desmoronar das convicções e das construções.
A Sacerdotisa, que representaria
o momento presente, é a mulher que apesar de olhar para a esquerda possui grande equilíbrio - a cor azul do intuitivo-emocional e a vermelha do terreno-carnal são compensadas. Por isso a sacerdotisa consegue balançar melhor escolhas e
palavras, e o livro na mão representa a sabedoria, sabedoria que no caso das relações
é dada pela experiência. Sua base e da Torre são bem diferentes. Aqui nessa carta é bem
grande, o apoio dela é firme, o olhar firme e o equilíbrio das cores é confirmado
por uma base de apoio ampla, nem as pernas são visíveis. Faz todo o sentido
para representar essa minha situação atual, em que apesar de continuar errando,
consigo olhar para as situações de forma mais equilibrada, sem nem sempre ser
temperamental, faço da experiência uma forma de sabedoria, quem sabe às vezes
um excesso de proteção. No fundo, a sacerdotisa não é consagrada só a uma
divindade e inacessível para todos os outros homens? O futuro é a Morte. Carta
maravilhosa, se despojada da leitura cristalizada do negativo da perda. A
grande transformação, o amor será possível só se nos despojarmos das crenças e
revolucionarmos tudo, a morte é a queda de tudo, a desconstrução de velhos
padrões. A grande transformação. Adieu
amor romântico da adolescência, adieu
amor livre da idade adulta, o que virá depois?